sábado, 31 de janeiro de 2009

Yves Montand - Le Chant des Partisans

Há algumas canções que nos ficam na memória pelo poder da música. Outras pelo poder da letra. Outras pela conjugação das duas. Outras ainda pela força interior que libertam. Esta canção por Yves Montand, que esteve longe de ser o seu primeiro interprete, aliás a sua interpretação é bastante posterior à utilização e intenção original da canção, canto de resistência ao ocupante Nazi.

Não obstante e talvez precisamente por isso a versão de Montand faz com que esta canção ganhe uma relevância que transcende esse período na história passando a ser uma canção de resistência a todo o tipo de invasão, a todo o tipo de imposição. As palavras se tomadas no sentido literal são obviamente violentas. Não as subscrevo nesse sentido (embora no contexto em que foram utilizadas fossem perfeitamente legítimas), entendo estas palavras no sentido metafórico, porque a resistência não implica forçosamente as armas: Significa isso sim coragem.

Oiçam aqui a canção. A letra é de Joseph Kessel e Maurice Druon . Joseph Kessel viria a fazer parte da Academia Francesa de Letras, estudei pelo menos um livro dele "Le Lion" um livro que recomendo. A música é de Anne Marly de origem russa (nasceu em S. Petersburgo e chamava-se Anna Betoulinski). Esta canção foi aliás originalmente escrita em Russo e depois traduzida e adaptada para Francês pelos dois autores já citados.

Le Chant des Partisans (A canção dos Resistentes)

Ami, entends-tu
Le vol noir des corbeaux
Sur nos plaines?
Ami, entends-tu
Les cris sourds du pays
Qu'on enchaîne?
Ohé! partisans,
Ouvriers et paysans,
C'est l'alarme!
Ce soir l'ennemi
Connaîtra le prix du sang
Et des larmes!

Amigo, ouves
o voo negro dos corvos
nas nossas planícies?
Amigo, ouves
os gritos surdos do país
que acorrentam?
Oh resistente,
Operários e Camponeses,
É o alarme!
Esta noite o inimigo
Conhecerá o preço do sangue
e das lágrimas!

Montez de la mine,
Descendez des collines,
Camarades!
Sortez de la paille
Les fusils, la mitraille,
Les grenades...
Ohé! les tueurs,
A la balle et au couteau,
Tuez vite!
Ohé! saboteur,
Attention à ton fardeau:
Dynamite!

Subam das minas
Desçam das colinas
Camaradas!
Tirem dos fardos de palha
As espingardas, as munições,
as granadas
Matadores,
com balas e com facas,
matai depressa!
Sabotador!
Cuidado com o teu fardo
Dinamite!

C'est nous qui brisons
Les barreaux des prisons
Pour nos frères,
La haine à nos trousses
Et la faim qui nous pousse,
La misère...
Il y a des pays
Ou les gens au creux de lits
Font des rêves;
Ici, nous, vois-tu,
Nous on marche et nous on tue,
Nous on crève.

Somos nós que quebramos
as barras das prisões
para os nossos irmãos,
o ódio que nos persegue
a fome que nos empurra
A miséria ...
Há países onde na cama
as pessoas sonham;
Aqui, nós, vê-la tu,
Nós marchamos e matamos
nós morremos.

Ici chacun sait
Ce qu'il veut, ce qui'il fait
Quand il passe...
Ami, si tu tombes
Un ami sort de l'ombre
A ta place.
Demain du sang noir
Séchera au grand soleil
Sur les routes.
Sifflez, compagnons,
Dans la nuit la Liberté
Nous écoute...


Aqui cada um sabe
o que quer, o que faz
quando passa ...
Amigo se tu caíres
Outro amigo sai da sombra
No teu lugar.
Amanhã o sangue negro
secará ao sol
nas estradas
assobiai, companheiros,
Na noite a liberdade,
ouve-nos ...

domingo, 25 de janeiro de 2009

Boris Vian - Le Deserteur

Numa altura em que nos dizem que a violência combate-se com ainda mais violência, numa altura em que depois de caído um muro se erguem outros dois, esta canção parece demasiado simples. Porém é só aparência. Porque não é obviamente fácil ou simples não reagir ao mal que nos fazem pagando na mesma moeda. Simples, isso sim, é pegar em armas e resolver pela força.

Não significa isto que por vezes não seja absolutamente necessário optarmos por essa via (a história mostra-nos infelizmente que há casos em que é assim), significa antes que sempre que nos digam que os fins que pretendemos atingir justificam os meios que utilizamos, sobretudo quando se sublinha "é a ÚNICA maneira" devemos sempre desconfiar. Os meios têm de ser sempre justos por si próprios, nunca função do fim a que nos propomos.

Esta canção escrita em 1954 é uma canção contra a Guerra da Argélia. Boris Vian (1920-1959) é um autor de canções e de poesia relativamente pouco conhecido. A Espuma dos Dias um romance simultaneamente de ficção cientifica e prosa poética é possivelmente a sua obra mais conhecida. Esta canção de todas as que escreveu é possivelmente a mais interpretada tendo inclusivamente conhecido uma versão portuguesa cantada por José Mário Branco.

A tradução que vos proponho da canção é mais próxima que a do referido cantor e poeta português dado que a letra portuguesa fazia referência explicita à guerra colonial. Pessoalmente prefiro (até porque esta canção na altura tinha uma intenção semelhante) manter uma versão neutra. No mesmo tipo de tema (canções anti-bélicas) podem também ouvir "Mourir pour des idées oui, mais de mort lente".

Oiçam esta canção de Boris Vian aqui.

Monsieur le Président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps
Je viens de recevoir
Mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir
Monsieur le Président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens
C'est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m'en vais déserter

Sr. Presidente
Estou a escrever-lhe uma carta
Que talvez lirá
se tiver tempo
Acabei de receber
os papeis do exercito
para partir para a guerra
até quarta-feira à noite
Sr. Presidente
Não quero fazer a guerra
Não estou na terra
para matar as pobres pessoas
Não o quero zangar
mas preciso de lhe dizer
que a minha decisão está tomada
vou desertar

Depuis que je suis né
J'ai vu mourir mon père
J'ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants
Ma mère a tant souffert
Elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers
Quand j'étais prisonnier
On m'a volé ma femme
On m'a volé mon âme
Et tout mon cher passé
Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J'irai sur les chemins

Desde que nasci
já vi o meu pai morrer
já vi os meus irmãos partir
e os meus filhos chorar
a minha mãe sofreu tanto
e seu túmulo
goza das bombas
goza dos versos
quando fui prisioneiro
roubaram a minha mulher
roubaram a minha alma
e todo o meu passado
Amanhã de madrugada
fecharei a porta
no nariz dos anos perdidos
e partirei pelos caminhos

Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens:
Refusez d'obéir
Refusez de la faire
N'allez pas à la guerre
Refusez de partir
S'il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
Vous êtes bon apôtre
Monsieur le Président
Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n'aurai pas d'armes
Et qu'ils pourront tirer


Irei mendigar a minha vida
nas estrada de França
Da Bretanha à Provence
e direi às pessoas:
"recusai obedecer
recusai fazê-la
não ides à guerra
recusai partir
Se for preciso dar sangue
então dê o seu
sr. presidente
se me perseguir
avise os seus polícias
que não tenho arma
e que poderão facilmente atirar

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Faleceu João Aguardela (1969-2009)

Neste blog em que procuramos demonstrar que na música popular também há grandes poetas, grandes compositores, João Aguardela tem certamente um lugar. Faleceu logo a seguir ao post sobre Ferré. Ficou em boa companhia, ele teria - penso - gostado.

Dos Sitiados confesso que guardo apenas memória de uma versão de uma música do José Afonso, mas essa ouvi-a sem exagero centenas de vezes. É um dos CDs que volta e meia está a rodar no leitor de CD´s do meu carro ...

Que descanse em paz.

Leiam no Público aqui um obituário mais detalhado

sábado, 17 de janeiro de 2009

Leo Ferré - Avec le Temps (1970)

A seguir a Brel, Brassens, Piaf só poderia ser Leo Ferré. Tenho neste caso como nos outros muita dificuldade em escolher uma canção, apenas uma canção, tenho mais de dez que me vêm imediatamente à memória. Dos quatro artistas de que falei aqui este foi o que consegui ver no Coliseu dos Recreios num concerto que não vou esquecer tão cedo !

Entre elas muitas dos grandes poetas que musicou: Baudelaire, Rimbaud, Appolinaire, Aragon, Verlaine entre outros sendo possivelmente responsável por um muito maior conhecimento

Porem para começar decidi que deveria ser uma canção com poema de Leo Ferré também. Mesmo assim ainda tenho o embaraço da escolha.

Esta canção, Avec le Temps é de 1970 fazendo parte de um dos discos mais relevantes de Léo Ferré o duplo album Amour Anarchie . Oiçam aqui esta canção interpretada pelo próprio (foi cantada por outros, inclusivamente a nossa Eugénia Melo e Castro numa das suas canções retoma uma parte desta canção) mas gosto de ouvir na versão "original".

Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
On oublie le visage et l'on oublie la voix
Le coeur quand ça bat plus s'est pas la peine d'aller
Chercher plus loin faut laisser faire et c'est très bien

Com o tempo
Com o tempo tudo parte

Esquecemos a cara e esquecemos a voz

Quando o coração já não bate já não vale a pena ir

Procurar mais longe é preciso deixar e é muito bom


Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
L'autre qu'on adorait qu'on cherchait sous la pluie
L'autre qu'on devinait au détour d'un regard
Entre les mots entre les lignes et sous le fard
D'un serment maquillé qui s'en va faire sa nuit
Avec le temps tout s'évanouit

Com o tempo
Com o tempo tudo parte

O outro que adorávamos que procurávamos à chuva

O outro que adivinhávamos na sombra de um olhar
Entre as palavras entre as linhas e no cansaço

De um sermão maquilhado que vai fazer a sua noite

Com o tempo tudo desvanece


Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
Même les plus chouettes souvenirs ça t'as une de ces gueules
A la Galerie Farfouille dans les rayons de la mort
Le samedi soir quand la tendresse s'en va toute seule

Com o tempo
Com o tempo tudo parte

Mesmo as melhores recordações tens uma destas caras

No centro comercial confusão no linear da morte

Sábado à noite quando a ternura se vai embora sozinha


Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
L'autre à qui l'on croyait pour un rhume pour un rien
L'autre à qui l'on donnait du vent et des bijoux
Pour qui l'on eût vendu son âme pour quelques sous
Devant quoi l'on se traînait comme traînent les chiens
Avec le temps va tout va bien

Com o tempo
Com o tempo tudo parte
O outro em que acreditávamos por uma constipação por um nada
O outro a quem dávamos o vento e jóias
Por quem teríamos vendido a alma para alguns tostões
À frente de quem rastejávamos como rastejam os cães
Com o tempo tudo se resolve

Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
On oublie les passions et l'on oublie les voix
Qui vous disaient tout bas les mots des pauvres gens
Ne rentre pas trop tard surtout ne prends pas froid

Com o tempo
Com o tempo tudo parte
Esquecemos as paixões e esquecemos as vozes
Que nos diziam muito baixo as palavras das pobres pessoas
Não voltes muito tarde sobretudo não apanhes frio

Avec le temps...
Avec le temps va tout s'en va
Et l'on se sent blanchi comme un cheval fourbu
Et l'on se sent glacé dans un lit de hasard
Et l'on se sent tout seul peut-être mais peinard
Et l'on se sent floué par les années perdues

Com o tempo
Com o tempo tudo parte
E sentimo-nos brancos com um cavalo cansado
E sentimo-nos gelados numa cama de ocasião
E sentimo-nos sós talvez mas tranquilos
E sentimo-nos roubados dos anos perdidos

Alors vraiment
Avec le temps on n'aime plus...

Então verdadeiramente
Com o tempo já não amamos

sábado, 10 de janeiro de 2009

Edith Piaf - La Vie en Rose

Esta canção de Edith Piaf (o poema é dela) a música é de Louis Gugliemi (também conhecido por "Louiguy" embora se pense que Marguerite Monnot também tenha participado na composição. A canção data de 1946 e para surpresa de Edith Piaf e dos seus próximos tornou-se um êxito sendo hoje uma das canções mais conhecidas não só de Edith mas mesmo da canção francesa.

O número de versões existentes é disso testemunho indo desde Armstrong até Pavarotti passando por outros nomes como Diana Krall, Donna Summer, Marlene Dietrich, Aznavour ...

Oiçam aqui esta canção numa interpretação extraída do filme "9 Garçons 1 Coeur" de 1948.

Des yeux qui font baiser les miens,
Un rire qui se perd sur sa bouche,
Voila le portrait sans retouche
De l'homme auquel j'appartiens

Uns olhos que fazem baixar os meus
Um riso que se perde na sua boca
Eis o retrato sem correcções
Do homem a que pertenço

Quand il me prend dans ses bras
Il me parle tout bas,
Je vois la vie en rose.

Quando ele me toma nos seus braços
Fala-me baixinho
e vejo a vida cor-de-rosa

Il me dit des mots d'amour,
Des mots de tous les jours,
Et ca me fait quelque chose.

Diz-me palavras de amor
palavras de todos os dias
e isso faz-me alguma coisa

Il est entré dans mon coeur
Une part de bonheur
Dont je connais la cause.

Entrou no meu coração
uma parte de felicidade
da qual sei a razão

C'est lui pour moi. Moi pour lui
Dans la vie,
Il me l'a dit, l'a juré pour la vie.

Sou eu para ele. Ele para mim
na vida
Ele disse-mo. Jurou-me para a vida.

Et des que je l'apercois
Alors je sens en moi
Mon coeur qui bat

E assim que o vejo
Então sinto
Bater o meu coração

Des nuits d'amour a ne plus en finir
Un grand bonheur qui prend sa place
Des enuis des chagrins, des phases
Heureux, heureux a en mourir.

Noites de amor sem fim
Uma grande felicidade que ganha o seu lugar
Aborrecimentos, desgostos, algumas fases
feliz, feliz, tão feliz que poderia morrer

Quand il me prend dans ses bras
Il me parle tout bas,
Je vois la vie en rose.

Quando ele me toma nos seus braços
Fala-me baixinho
e vejo a vida cor-de-rosa

Il me dit des mots d'amour,
Des mots de tous les jours,
Et ca me fait quelque chose.

Diz-me palavras de amor
palavras de todos os dias
e isso faz-me alguma coisa

Il est entré dans mon coeur
Une part de bonheur
Dont je connais la cause.

Entrou no meu coração
uma parte de felicidade
da qual sei a razão

C'est toi pour moi. Moi pour toi
Dans la vie,
Il me l'a dit, l'a jure pour la vie.

Sou eu para ele. Ele para mim
na vida
Ele disse-mo. Jurou-me para a vida.

Et des que je l'apercois
Alors je sens en moi
Mon coeur qui bat

E assim que o vejo
Então sinto
Bater o meu coração

sábado, 3 de janeiro de 2009

Georges Brassens (1921-1981) - Je me suis fait tout petit

Nos próximos tempos vou continuar na música de expressão francesa, por razões meramente cronológicas (foram as canções da minha infância, algumas delas ...). A tradução a partir do original em francês é minha.

Georges Brassens
JE ME SUIS FAIT TOUT PETIT (1955)
Oiçam aqui esta canção interpretada por Brassens.

Canção dedicada a Joha Heiman (1911-1999) Estoniana por quem se apaixonou, e a quem foi fiel a partir dessa data, apesar de nunca ter casado ou sequer vivido com ela (Brassens conheceu-a em 1947 ou seja oito anos antes desta canção).

Je n'avait jamais ôté mon chapeau
Devant personne
Maintenant je rampe et je fait le beau
Quand elle me sonne
J'étais chien méchant elle me fait manger
Dans sa menotte
J'avais des dents de loup, je les ai changées
Pour des quenottes!

Nunca tinha tirado o meu chapéu
para ninguém
Agora rastejo e faço habilidades
quando ela me chama
Era um cão vadio agora ela faz-me comer
com as suas algemas
Tinha dentes de lobo e mudei-os
para dentes de leite

[Refrão]
Je me suis fait tout petit devant une poupée
Qui ferme les yeux quand on la couche
Je me suis fait tout petit devant une poupée
Qui fait Maman quand on la touche.

Fiz-me muito pequeno face a uma boneca
Que fecha os olhos quando a deitamos
Fiz-me muito pequeno face a uma boneca
Que diz mamã quando a tocamos

J'étais dur à cuire elle m'a converti
La fine mouche
Et je suis tombé tout chaud, tout rôti
Contre sa bouche
Qui a des dents de lait quand elle sourit
Quand elle chante
Et des dents de loup, quand elle est furie
Qu'elle est méchante.

Eu não era pêra doce mas ela converteu-me
a velha raposa
e caí quente e pronto a comer
contra a sua boca
que tem dentes de leite quando sorri
quando canta
e dentes de lobo quando está furiosa
quando é maldosa

[Refrão]

Je subis sa loi, je file tout doux
Sous son empire
Bien qu'elle soit jalouse au-delà de tout
Et même pire
Une jolie pervenche qui m'avait paru
Plus jolie qu'elle
Une jolie pervenche un jour en mourut
A coup d'ombrelle.

Respeito as suas leis, sou cordeiro manso
sobre as suas ordens
Mesmo que ela seja ciumenta acima de tudo
e mesmo pior
Uma bela murta que me havia parecido
mais bela que ela
Uma bela murta um dia morreu
a golpes de guarda-chuva

[Refrão]


Tous les somnambules, tous les mages m'ont
Dit sans malice
Qu'en ses bras en croix, je subirais mon
Dernier supplice
Il en est de pires il en est de meilleures
Mais à tout prendre
Qu'on se pende ici, qu'on se pende ailleurs
S'il faut se pendre.

Todos os sonâmbulos, todos os mágicos
disseram-me sem malícia
que nos seus braços em cruz
passarei meu ultimo suplício
Há piores, Há melhores
mas já que é preciso
que nos enforquemos aqui, melhor aqui que ali
se é mesmo necessária a forca

[Refrão]

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Amsterdam - Jacques Brel (1929-1978)

Curiosamente esta canção que viria a ser uma das mais conhecidas de Brel nunca fez parte de nenhum dos seus discos de originais para gravação em Estúdio. Em parte compreende-se porque esta canção ganha imenso com a interpretação de Brel em palco.

Foi interpretada pela primeira vez ao vivo no Olympia em 1964 com uma ovação em pé de três minutos. A tradução para português do original em francês é minha.

Oiçam aqui o único Jacques Brel numa das suas interpretações desta canção fabulosa.

Aviso: A linguagem é um razoavelmente forte (e procurou manter-se na tradução).

Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui chantent
Les rêves qui les hantent
Au large d'Amsterdam
Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui dorment
Comme des oriflammes
Le long des berges mornes
Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui meurent
Pleins de bière et de drames
Aux premières lueurs
Mais dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui naissent
Dans la chaleur épaisse
Des langueurs océanes

No porto de Amesterdão
Há marinheiros que cantam
Os sonhos que os perseguem
Ao largo de Amsterdão
No porto de Amsterdão
Há marinheiros que dormem
como estandartes
ao longo das margens mornas
No porto de Amsterdão
Há marinheiros que morrem
cheios de cerveja e dramas
à primeira luz da madrugada
mas no porto de Amsterdão
Há marinheiros que nascem
no calor espesso
da fadiga oceânica

Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui mangent
Sur des nappes trop blanches
Des poissons ruisselants
Ils vous montrent des dents
A croquer la fortune
A décroisser la lune
A bouffer des haubans
Et ça sent la morue
Jusque dans le coeur des frites
Que leurs grosses mains invitent
A revenir en plus
Puis se lèvent en riant
Dans un bruit de tempête
Referment leur braguette
Et sortent en rotant

No porto de Amsterdão
há marinheiros que comem
em toalhas demasiado brancas
peixes escorregadios
mostram-vos os dentes
que mastigam a sorte
diminuem a lua
comeriam cabos
e cheira a bacalhau
até ao coração dos fritos
que as suas mãos grandes
convidam a repetir
depois levantam-se rindo
num barulho de tempestade
fecham a braguilha
e saem arrotando

Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui dansent
En se frottant la panse
Sur la panse des femmes
Et ils tournent et ils dansent
Comme des soleils crachés
Dans le son déchiré
D'un accordéon rance
Ils se tordent le cou
Pour mieux s'entendre rire
Jusqu'à ce que tout à coup
L'accordéon expire
Alors le geste grave
Alors le regard fier
Ils ramènent leur batave
Jusqu'en pleine lumière

No porto de Amsterdão
Há marinheiros que dançam
roçando a sua pança
na pança das mulheres
e giram e dançam
como sois cuspidos
num som rasgado
de um acordeão ranço
Voltam o pescoço
para melhor se ouvir rir
até que de repente
o acordeão morre
e então com um gesto grave
com um olhar orgulhoso
levam a sua carcaça
até à luz

Dans le port d'Amsterdam
Y a des marins qui boivent
Et qui boivent et reboivent
Et qui reboivent encore
Ils boivent à la santé
Des putains d'Amsterdarn
De Hambourg ou d'ailleurs
Enfin ils boivent aux dames
Qui leur donnent leur joli corps
Qui leur donnent leur vertu
Pour une pièce en or
Et quand ils ont bien bu
Se plantent le nez au ciel
Se mouchent dans les étoiles
Et ils pissent comme je pleure
Sur les femmes infidèles

Dans le port d'Amsterdam
Dans le port d'Amsterdam.

No porto de Amsterdão
há marinheiros que bebem
e que bebem e rebebem ainda
e que bebem mais ainda
bebem à saúde
das putas de Amsterdão
De Hamburgo ou de outro local
enfim bebem às senhoras
que lhes oferecem o seu corpo
que lhes oferecem a sua virtude
por uma moeda de ouro
e quando beberam suficiente
espalham o nariz no céu
assoam-se nas estrelas
e mijam como eu choro
nas mulheres infiéis

No porto de Amsterdão
No porto de Amsterdão

Post Inicial

Como alguns já sabem pelo meu outro blog Diz que não gosta de música clássica para além deste tipo de música gosto também muito de música popular de expressão portuguesa e francesa.

Não é que não aprecie a música popular anglo-saxónica mas, sem chauvinismos ou pretensas defesas da língua ou da cultura acho que esse tipo de música já tem promoção suficiente e espaço suficiente nesta nossa blogosfera quanto mais não seja nos Hi5 desta vida, com o devido respeito e vénia.

A decisão de começar este novo blog precisamente no inicio do ano está obviamente relacionado com uma daquelas promessas de Ano Novo. O que vou aqui procurar partilhar convosco são todas as canções, todos os artistas, cantores e poetas de que gosto.

Incluirei também a língua espanhola e italiana neste conjunto porque embora conheça muito mal a música desses países há algumas coisas de que gosto muito e em todo o caso será também uma ocasião para passar a conhecer melhor.

Para inaugurar este blog tinha várias hipóteses todas elas com as suas razões de ser. Poderia começar com a primeira canção de que me lembro da minha infância. "La Bohéme" de Charles Aznavour. Lembro-me de pedir à minha mãe que a colocasse no gravador de K7 e de lhe chamar "La Fenêtre", com 5 anos soava-me melhor ... Poderia também começar com Elis Regina e aqui estaríamos a falar de Águas de Março que ouvi vezes sem conta. Poderia ainda começar com o nosso enorme poeta Ary dos Santos e aí falaria-vos de Estrela da Tarde certamente, ou Amália e nesse caso Foi Deus. Poderia também começar com Piaf e La Vie en Rose ou Brassens e "Les Copains d´abord". Ou podia ser Brel ... e aí haveria ainda um embaraço na escolha da canção.

Só podendo ser um escolhi Jacques Brel sem outra razão que não fosse por hoje estar para aí virado.